sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Carta ao viajante

A viagem começa quando aportamos nesse planeta, vindos não sei de onde e trazendo na pele um cheiro especial. Um cheiro do cosmos, talvez! O primeiro grito! Um choro... um gemido.
Depois aprendemos a sorrir, falar, andar, correr... Enfim...
a viagem está só começando. Deram-nos à luz! Viajamos pela luz e pela penumbra, viajamos nos sons, nos movimentos, nas cores e formas, nos vultos, na inconsciencia, na ignorancia, na aprendizagem, na sabedoria... Quiçá na consciencia plena! Viajamos! A jornada pode ser longa ou curta, poderemos ter todo o tempo do mundo, ou o tempo pode nos virar as costas. Viajamos por estradas largas, claras, floridas, estreitas, íngremes, asfaltadas ou enlameadas. Atolamos! Capotamos! Pode pintar socorro, ou não! Talvez saiamos ilesos, talvez feridos, ou apenas arranhões! Viajamos! Pelos verdes vales do fim do mundo, ou somente nos fins de semana, ou pelo quintal de casa, ou sentados na varanda. Mesmo assim viajamos. Sós! com amores ou amigos, com fantasmas... Alegres ou tristes, sonhadores, cabisbaixos, desiludidos, angustiados, desenfreados, perpléxos! Com bagagem, com excesso, sem nada! Sem lenço sem documento! De carona, a pé ou de avião. Viajamos! Não importa como, não importa o veículo, nem o percurso, nem as distancias, nem os atrazos, nem os percalços, nem estar dormindo ou acordados. Viajamos! Viajaremos sempre, enquanto houver vida, porque a vida é a viagem e a paisagem é tudo em volta. A morte? talvez seja apenas mais uma conexão!

Filho feliz


Eu joguei terra nos seus sonhos,

joguei água nos castelos de areia,

quebrei sua gaita, seus dados...

sua varinha de condão.

Rasguei seu gibí de super-homem,

e tapei os ouvidos, pra não ouvir seus gritos,

seus gemidos, seus nãos.

Foi tudo em vão!

Eles ecoam tão fortes, dentro de mim,

até hoje!

Eu devorei os seus aniversários!

Soprei as velas do seu bolo!

Usei no seu pescoço, o meu escapulário.

Abri o seu diário, risquei o mês de agosto.

Foi tudo em vão!

Segurei sua mão quando tinha febre,

espremi seus cravos, suas espinhas...

Te dei chá de boldo no primeiro porre.

Sorri feliz quando te vi com uma menina.

Te ensinei tantas coisas....

Que nem eu mesma sabia.

Tantas certezas que eu não tinha.

Quantas respostas que não dei.

Errei! poucas vezes acertei.

Sofri, ainda sofro, não sei!

Por tudo que eu disse.... E o que calei.

Por tudo que fiz, e o que não fiz.

Só queria que existisse um manual,

ensinando mãe, fazer filho feliz!

possui esse caminho um coração?




Nesses caminhos de folhas secas,
pelo chão tão fértil...
Perco meu coração, que cai do peito,
diante dos meus olhos incrédulos,
perco meu coração,
e com ele um chapéu de feltro
e um casaco velho.
nesses caminhos, agora úmidos,
a noite caiu, eu nem me dei conta!
Meu coração geme de frio!
Sujo de terra, chama por mim.
E eu sigo em frente, cega! Surda
Me fazendo de tonta!

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Nossos gritos


Nossos gritos, pra onde vão?
Em que canto do universo,
estarão escondidos?
Terão se calado?
ou se juntado a outros gritos?

Noite urbanas



Na solidão das noites de neon,
escancarei as portas do meu peito!
Gritei palavras, vomitei verbos!
Murmurei versos, ensaiei jeitos.
Na solidão do meu peito...
As sombras da noite roncavam,
e rugiam.
Me fiz boneco de neve,
mas o sol me derreteu,
quando amanheceu o dia.
"E o inverno finalmente venha..."

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Eu quero flores


Eu quero flores nos meus vasos sanguíneos
e quadros de Van Gogh nas paredes das artérias
quero energia convertida em matéria
e baguá na porta do meu peito
eu quero o rio, a margem e o leito
um imenso ofurô dentro de mim
quero tatame pra fazer o tai chi
e a música de Shiva em meus ouvidos
eu quero os dias que virão e os dias idos
inseridos na mandala em minhas mãos
quero viver o caos e a criação
e entender os mistérios do universo
eu quero a capa, eu quero o verso
quero a sequência do céu anterior
quero a imensa mão do Criador
fazendo um reiki sobre a minha cabeça
eu quero que tudo isso aconteça...
E que um dia a lua teça,
um manto prata sobre mim!

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Pra lá de Marrakech



Eu sou a multidão na praça de Marrakech.
O flautista que toca pras cobras.
A odalisca perdida no tempo.
O vendedor de dentaduras...
A moça bérbere, tão pura...
Eu sou a mosca que ronda o tajine.
Eu sou o haxixe oferecido nas esquinas dos becos.
Eu sou os frutos secos amontoados nos cestos.
Eu sou a cor dos temperos.
Sou o cheiro dos cortumes.
A fumaça dos narguilés.
As tatuagens nas mãos da mulher.
Eu sou a fé mulçumana.
A medina, a mesquita.
Eu sou a roupa esquisita.
Sou o arroto do camelo.
Sou a beleza e o medo.
Sou as muralhas ocres que circundam a cidade.
Sou a vaidade velada e tímida da menina
do rímel nos olhos, do rosto coberto.
Sou a tinta dos homens azuis do deserto.

Sou a tenda do tuareg sob o céu que nos protege.
Sou a pedra vermelha que caiu do colar.
Sou o luxo suntuoso do palácio de Alá.
Sou o chá de hortelã.
Os novelos tingidos, de lã.
Sou hum dirram.
Os tapetes pendurados nas paredes.
Sou a água salobra, sou a sede.
Sou o gelo derretido das Cordilheiras Atlas.
Sou as pétalas de rosas caídas no vale.
Sou a pata quebrada da ovelha perdida.
Sou uma centelha de luz que ainda brilha.
Sou o deserto, sou o oásis.
Sou o mar de Essauíra.